Não Tive Tempo :Texto de Patrícia Albuquerque Maia

Não tive tempo
Uma reflexão fundamental nos dias atuais

Patrícia Albuquerque Maia
Professora de Administração do IFRN


NÃO TIVE TEMPO… Caso não esteja com um sentimento de revolta, medo, decepção, angustia, raiva…. Sugiro que não leia esse texto.

 Gostaria de ter belas palavras de carinho, apoio e solidariedade para a família da Benes Jr., cuja vida foi ceifada de forma brutal por marginais. Conheci-o pouco, era meu aluno, mas só tive tempo de ministrar duas aulas, mas sei pelos colegas que era especial, cheio de sonhos e planos. 

Não sei mensurar a dor desses pais, somente posso imaginar, por ser mãe e pensar que poderia ser com os meus filhos. NÃO TIVE TEMPO de falar com ele de sonhos, não tive tempo de dizer que o mundo é lindo, NÃO TIVE TEMPO de falar de amor, NÃO TIVE TEMPO de escutá-lo, NÃO TIVE TEMPO de conhecer seus anseios, NÃO TIVE TEMPO de dançar forró nas festas do IF Lajes, NÃO TIVE TEMPO… Ele NÃO TEVE TEMPO!! 

 Nestas horas sempre tenho vontade de deixar de usar as redes sociais, tamanho é meu horror de como está sendo usada. Coisas horríveis, falta de respeito a família para obter “mais curtidas”, cada um diz algo,, vi “estava na hora errada e no lugar errado”, “um grande azar”, não estava no lugar errado, nem no lugar errado, nem foi azar, foi morte de “Brasil”!!! Em três anos perdi 3 alunos, a bela Karol Álvares, aluna de Turismo morta com um tiro no peito, o aluno de administração Samildo, morto por um mosquito. Vi umas postagens do tipo “tomara que aconteça com os filhos do Governador”, ou “precisa acontecer com filhinhos de papai para que se faça algo”. 

NÃO, NÃO deveria estar acontecendo com ninguém, deveríamos poder andar pelas calçadas, falar ao celular, comer em lugares, ir a praia, ir a uma clínica sem temos medo! Não quero que nenhum pai ou mãe precise sofrer essa dor para que se faça algo! TODOS somos filhinhos de papai e mamãe, não importa qual a renda, cor, local de moradia… REVOLTA.

Benes não foi morto por azar, Benes foi morto por décadas de corrupção, incompetência e falta de investimento em políticas públicas de segurança, educação e todas as outras, no âmbito Federal, Estadual e Municipal. O tiro que ceifou este menino foi um tiro no peito de cada família, tanto forte e que deve ecoar em quem pensa no futuro. Solidarizo-me com todos que são e estão sendo vítimas diariamente, solidarizo-me com a colega de psicologia de meu filho que teve a mãe brutalmente assassinada (3 anos se passaram) por tentar salva-la, com minha sobrinha, que com a afilhada de dois anos foi vítima de uma assalto com uma arma na cabeça, solidarizo-me com meu enteado, cujo carro foi tragado por uma obra da copa que nunca foi concluída, com meu filho que teve uma arma apontada na cabeça com sua namorada as 9h da noite em frente a nossa casa (3 anos se passaram), com um amigo do meu filho que foi sequestrado em plena UFRN…. Esses me são próximos, a violência já dentro de minha casa, será que você não viu que está em sua porta? 

 Não precisamos de um “Estado Islâmico”, já temos o nosso! Você tem medo de ir para Síria, Egito ou qualquer país que eles atuem? Não precisa! A Síria é aqui! Não me importa no que você acredita ou defende, pena de morte ou não, desarmamento ou não, direitos humanos ou não. Gostaria era que todos defendessem a vida, o direito à liberdade e a punição justa dos culpados, sejam eles bandidos de rua ou os grandes de nossa nação. 

 Se você já chegou aqui nessa leitura/desabafo, talvez se sinta como eu. Estamos adormecidos????

Sentamos no computador e postamos? Cortamos sinais de trânsito para nos protegermos? Trancamo-nos em casa? Ah!!! Por muito menos populações vão a rua, mobilizam-se, lutam, gritam! ATÉ QUANDO ficaremos assim? ATÉ QUANDO não nos importaremos? ATÉ QUANDO fecharemos os olhos e praticaremos a inércia?

 Esquecemos quem passa por isso todos os dias? Se não temos polícia suficiente, conclamemos as Forças Nacionais, mais Policiais, Agentes de Segurança… o que for! Até quando os Governos Estadual e Municipal vão se mostrar mais inseguros em atitudes do que a própria população está sentindo.

Quero o que me foi prometido quando tinha a idade de Benes, de Karol, de Samildo, quero o País do futuro, um futuro que nunca chegou… Quero deitar a noite tranquila com meus filhos na rua, quero paz, quero justiça, quero poder caminhar na minha rua, quero uma praça… Nesse momento um terreno no cemitério é um grande investimento! 

Meu marido ontem pediu, escreva algo, fale, você é boa com as palavras, eu disse NÃO, já fiz isso estou cansada, mas durante a noite, cada vez que me deitava, vi esses rostos, os seus sorrisos, os seus sonhos que jamais se concretizarão.

Não quero organizar passeatas, escrever “Natal pede paz”… Queria que, em uma hora de um dia qualquer, todos de branco descêssemos de nossas empresas, instituições, casas, palácios (de areia) e ficássemos nas calçadas da cidade, 10 minutos de silêncio por todos os que morreram nesta guerra “mascarada”, sem partidos, somente nós, POVO, PESSOAS, PAIS, IRMÃOS….. Um momento onde os veículos de comunicação (que possibilitam um alcance maior) chamassem, conclamassem a todos…. Seriam corredores e corredores silenciosos de pessoas, em todos os pontos da cidade…. 

Ah!! Mais isso fez parte do meu sonho/pesadelo de ontem.

 À família Benes Leocádio, aos meus alunos do 1º Ano de Administração do CNAT/IFRN e a todos que já sofreram e sofrem suas perdas, desejo que Deus possa confortar nossas almas.

 Patrícia de Albuquerque Maia – Professora de Administração do IFRN – Lajes e CNAT

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